Na sua crónica da passada segunda-feira, o Daniel Lourenço alertava para a necessidade urgente de se fazer uma renovação na Selecção AA de Portugal, porque a média de idades do conjunto que derrotou a Sérvia no passado Domingo já anda na casa dos 30. Não há dúvida nenhuma que o seleccionador Fernando Santos está perfeitamente consciente desse problema, mas a primeira abordagem que encetou para a solução do mesmo não correu da melhor forma. Nem poderia ter corrido.
Aproveitando uma nobre decisão da Federação Portuguesa de Futebol, de realizar um jogo amigável com a selecção de Cabo Verde, para angariar fundos de apoio às vítimas da erupção do Vulcão do Pico ocorrida numa das ilhas daquele arquipélago africano, o seleccionador português decidiu dar a primeira oportunidade a vários jogadores. Até aí tudo bem. Mas a renovação de uma selecção faz-se lançando os jogadores gradualmente e tendo sempre como base a formação habitualmente titular.
Ontem, Fernando Santos resolveu fazer uma revolução no onze inicial, colocando em campo um conjunto de jogadores que só tivera oportunidade de realizar dois a três treinos de conjunto. Assim, apresentou uma equipa sem entrosamento, sem rotinas de jogo, sem um mínimo de conceito colectivo. Esta renovada equipa das Quinas foi posta à prova diante de uma formação africana na sua máxima força, muito bem trabalhada pelo técnico português Rui Águas, que não vai há muito tempo esteve a competir ao mais alto nível na CAN. Esta actual selecção de Cabo Verde está muito acima de algumas selecções europeias de segundo plano. Não é nenhum Gibraltar, nem nenhum Liechtenstein. Não diria que jogue melhor do que a Sérvia, como afirmou Rui Águas na antevisão da partida, mas com o tempo pode lá chegar, embora não tenha os mesmos argumentos individuais. Está de parabéns o antigo ponta-de-lança internacional português.
Para dificultar ainda mais a vida aos estreantes lusos, o jogo foi disputado num estádio onde o futebol se torna quase impraticável em dias de vento: o António Coimbra da Mota, no Estoril; onde os adeptos de Cabo Verde estiveram em maioria e puderam assistir a uma histórica vitória da sua equipa diante de uma esfrangalhada selecção portuguesa.
Porque o jogo era amigável, abstenho-me de fazer a respectiva análise detalhada. Apenas registar, para a história, os golos cabo-verdianos, apontados por Odair Fortes e Gegé, ainda na primeira parte. A ficha de jogo pode ser consultada aqui... até porque hoje é dia 1 de Abril e não vão alguns, mais distraídos, achar que se trata de um chiste típico deste dia...
De registar ainda a estreia do novo equipamento alternativo, produzido pela marca de equipamentos que há vários anos patrocina a FPF. Trata-se de um uniforme preto, recortado por duas riscas com variantes garridas da cor da bandeira nacional, de gosto discutível, como é apanágio desta marca.
Os jogadores de Portugal, um a um
Antony Lopes: o guarda-redes do Lyon é uma das grandes figuras da sua equipa e da presente edição da Ligue I. Já fora várias vezes convocado, mas só ontem fez a sua estreia a titular. Não foi feliz, porque o primeiro golo de Cabo Verde é um frango. A força do vento não desculpa tudo.
Cédric: um jogador regular que geralmente cumpre o seu dever, mas do qual se percebe não ter capacidade de evoluir muito mais. É provável que Bosingwa continue a merecer a confiança do treinador para a titularidade da lateral-direita da defesa.
André Pinto: uma estreia desastrada de um jogador que é o líder de uma das melhores defesas do campeonato português. Na primeira parte, falhou na marcação a Gégé e o lance resultou no segundo golo de Cabo Verde. Na segunda, deixou Heldon fugir-lhe e depois rasteirou-o quando o avançado dos quadros do Sporting seguia para a baliza. Foi expulso com vermelho directo.
Paulo Oliveira: o jovem central do Sporting também acusou demasiado a responsabilidade e esteve muito intranquilo. Foi uma das vítimas da falta de entrosamento entre o quarteto defensivo e o bloco recuado do meio campo.
Antunes: Regressou à selecção depois de um período de ausência. A sua experiência e capacidade permitiram-lhe exibir-se em melhor plano que os restantes colegas da defesa. Enquanto Fábio Coentrão for aposta para o meio-campo, pode sempre aspirar a disputar a titularidade com Eliseu.
Adrien: É um jogador cuja qualidade é inquestionável, mas necessita de uma “muleta” no meio-campo para poder fazer a diferença. Ontem não havia William Carvalho, nem Tiago, e por isso o médio leonino teve uma exibição algo sofrida. Ainda assim, foi dos melhorzinhos ontem.
André Gomes: Tem um registo futebolístico muito parecido com Hugo Viana: jogador cerebral, exímio no passe e pleno de técnica. Mas tem um problema: não corre. No actual contexto do futebol este é um pecado capital. O médio do Valência teve uma prestação muito medíocre.
João Mário: Provavelmente o melhor em campo de Portugal. Muito activo, tanto nas tarefas do meio-campo, como a aparecer junto da área em apoio ao ataque. É claramente uma opção para a primeira equipa.
Vierinha: Existe uma espécie de “síndrome da Selecção Nacional” a afectar alguns jogadores, que os impede de realizarem pela equipa das Quinas as boas prestações que realizam nos clubes. Danny é o exemplo mais claro, mas Vierinha também parece sofrer do mesmo mal. Apesar de tudo, esteve um pouco melhor na segunda parte.
Bernardo Silva: Tal como João Mário, rubricou uma boa exibição e também está a mostrar qualidades que o poderão catapultar dos Sub-21 para os AA. É mais um jovem valor que está a ser bem trabalhado por Leonardo Jardim. Nesta partida, alinhou inicialmente pelos flancos e depois deslocou-se para o centro.
Hugo Almeida: Não se percebe a chamada de um jogador a atravessar um sofrível final de carreira, quando o lema é renovar e dar novas oportunidades a outros jogadores mais jovens. O ponta-de-lança passou completamente à margem do jogo.
Ukra: Entrou na segunda parte, fazendo a sua estreia na selecção aos 27 anos. Actuou sobre o flanco esquerdo e ainda conseguiu dar algum ar da sua graça.
Danilo Pereira: Entrou para reajustar a defesa após a expulsão de André Pinto. Beneficiou do relaxamento dos cabo-verdianos, que geriam uma vantagem de 2-0. Apesar de tudo, cumpriu quando foi chamado.
Pizzi: Demasiado discreto para aquilo que se lhe exige. Terá de mostrar mais se quiser espreitar um lugar na primeira equipa.
Éder: Ainda não foi desta vez que se estreou a marcar. Entra sempre com vontade, mas não consegue assumir-se como alternativa credível para um lugar onde há tanta escassez de opções.
André André: Foi uma espécie de bálsamo numa equipa deprimida. Provou ser merecedor de outras chamadas.
André Almeida: Entrou para colocar ordem no sector mais recuado, valendo-se da sua experiência e tarimba internacional.
E agora?
Esta tentativa gorada de avançar com o processo de renovação foi mal planeada, nem parece de um engenheiro. Então, quais serão os passos certos a dar?
- Começar por identificar as prioridades, isto é, quais as posições tácticas onde a selecção está mais desfalcada? Quais os jogadores em final de carreira que se irão retirar em 2016? As escolhas de novos elementos devem focar-se nestes dois itens.
- Fazer a integração progressiva de jogadores. Mesmo em jogos particulares, não desmantelar a estrutura base. Efectuar alterações pontuais, lançando um a dois novos jogadores em cada sector. Os novos elementos rapidamente assimilarão as rotinas e entrosamento com os demais titulares habituais.
- Tal como referiu o Daniel Lourenço, a selecção nacional tem todas as condições para garantir o apuramento mais cedo, sem ter de esperar pelo último jogo como vem sendo habitual. Portanto, os últimos jogos do apuramento poderão servir de laboratório de ensaio de novas opções.
- Na sua apresentação, Fernando Santos assumiu que contava com todos os jogadores. Está correcto. Porém, é necessário identificar determinados jogadores, cujo contributo está esgotado e não trarão mais nenhum valor acrescentado, como é o caso de Hugo Almeida, mas há outros jogadores na mesma situação.
- Finalmente, estar muito atento ao Campeonato da Europa de Sub-21 a disputar na República Checa no final da época. As jovens esperanças lusas vão ser colocadas à prova diante de selecções fortes. A este nível de competição é possível destrinçar aqueles que reúnem as condições para estarem no Europeu de França do próximo ano.
Ricardo Jorge
Texto redigido de acordo com as normas do antigo Acordo Ortográfico (Decreto lei 35.228/45)
Aproveitando uma nobre decisão da Federação Portuguesa de Futebol, de realizar um jogo amigável com a selecção de Cabo Verde, para angariar fundos de apoio às vítimas da erupção do Vulcão do Pico ocorrida numa das ilhas daquele arquipélago africano, o seleccionador português decidiu dar a primeira oportunidade a vários jogadores. Até aí tudo bem. Mas a renovação de uma selecção faz-se lançando os jogadores gradualmente e tendo sempre como base a formação habitualmente titular.
Ontem, Fernando Santos resolveu fazer uma revolução no onze inicial, colocando em campo um conjunto de jogadores que só tivera oportunidade de realizar dois a três treinos de conjunto. Assim, apresentou uma equipa sem entrosamento, sem rotinas de jogo, sem um mínimo de conceito colectivo. Esta renovada equipa das Quinas foi posta à prova diante de uma formação africana na sua máxima força, muito bem trabalhada pelo técnico português Rui Águas, que não vai há muito tempo esteve a competir ao mais alto nível na CAN. Esta actual selecção de Cabo Verde está muito acima de algumas selecções europeias de segundo plano. Não é nenhum Gibraltar, nem nenhum Liechtenstein. Não diria que jogue melhor do que a Sérvia, como afirmou Rui Águas na antevisão da partida, mas com o tempo pode lá chegar, embora não tenha os mesmos argumentos individuais. Está de parabéns o antigo ponta-de-lança internacional português.
Para dificultar ainda mais a vida aos estreantes lusos, o jogo foi disputado num estádio onde o futebol se torna quase impraticável em dias de vento: o António Coimbra da Mota, no Estoril; onde os adeptos de Cabo Verde estiveram em maioria e puderam assistir a uma histórica vitória da sua equipa diante de uma esfrangalhada selecção portuguesa.
Porque o jogo era amigável, abstenho-me de fazer a respectiva análise detalhada. Apenas registar, para a história, os golos cabo-verdianos, apontados por Odair Fortes e Gegé, ainda na primeira parte. A ficha de jogo pode ser consultada aqui... até porque hoje é dia 1 de Abril e não vão alguns, mais distraídos, achar que se trata de um chiste típico deste dia...
De registar ainda a estreia do novo equipamento alternativo, produzido pela marca de equipamentos que há vários anos patrocina a FPF. Trata-se de um uniforme preto, recortado por duas riscas com variantes garridas da cor da bandeira nacional, de gosto discutível, como é apanágio desta marca.
Os jogadores de Portugal, um a um
Antony Lopes: o guarda-redes do Lyon é uma das grandes figuras da sua equipa e da presente edição da Ligue I. Já fora várias vezes convocado, mas só ontem fez a sua estreia a titular. Não foi feliz, porque o primeiro golo de Cabo Verde é um frango. A força do vento não desculpa tudo.
Cédric: um jogador regular que geralmente cumpre o seu dever, mas do qual se percebe não ter capacidade de evoluir muito mais. É provável que Bosingwa continue a merecer a confiança do treinador para a titularidade da lateral-direita da defesa.
André Pinto: uma estreia desastrada de um jogador que é o líder de uma das melhores defesas do campeonato português. Na primeira parte, falhou na marcação a Gégé e o lance resultou no segundo golo de Cabo Verde. Na segunda, deixou Heldon fugir-lhe e depois rasteirou-o quando o avançado dos quadros do Sporting seguia para a baliza. Foi expulso com vermelho directo.
Paulo Oliveira: o jovem central do Sporting também acusou demasiado a responsabilidade e esteve muito intranquilo. Foi uma das vítimas da falta de entrosamento entre o quarteto defensivo e o bloco recuado do meio campo.
Antunes: Regressou à selecção depois de um período de ausência. A sua experiência e capacidade permitiram-lhe exibir-se em melhor plano que os restantes colegas da defesa. Enquanto Fábio Coentrão for aposta para o meio-campo, pode sempre aspirar a disputar a titularidade com Eliseu.
Adrien: É um jogador cuja qualidade é inquestionável, mas necessita de uma “muleta” no meio-campo para poder fazer a diferença. Ontem não havia William Carvalho, nem Tiago, e por isso o médio leonino teve uma exibição algo sofrida. Ainda assim, foi dos melhorzinhos ontem.
André Gomes: Tem um registo futebolístico muito parecido com Hugo Viana: jogador cerebral, exímio no passe e pleno de técnica. Mas tem um problema: não corre. No actual contexto do futebol este é um pecado capital. O médio do Valência teve uma prestação muito medíocre.
João Mário: Provavelmente o melhor em campo de Portugal. Muito activo, tanto nas tarefas do meio-campo, como a aparecer junto da área em apoio ao ataque. É claramente uma opção para a primeira equipa.
Vierinha: Existe uma espécie de “síndrome da Selecção Nacional” a afectar alguns jogadores, que os impede de realizarem pela equipa das Quinas as boas prestações que realizam nos clubes. Danny é o exemplo mais claro, mas Vierinha também parece sofrer do mesmo mal. Apesar de tudo, esteve um pouco melhor na segunda parte.
Bernardo Silva: Tal como João Mário, rubricou uma boa exibição e também está a mostrar qualidades que o poderão catapultar dos Sub-21 para os AA. É mais um jovem valor que está a ser bem trabalhado por Leonardo Jardim. Nesta partida, alinhou inicialmente pelos flancos e depois deslocou-se para o centro.
Hugo Almeida: Não se percebe a chamada de um jogador a atravessar um sofrível final de carreira, quando o lema é renovar e dar novas oportunidades a outros jogadores mais jovens. O ponta-de-lança passou completamente à margem do jogo.
Ukra: Entrou na segunda parte, fazendo a sua estreia na selecção aos 27 anos. Actuou sobre o flanco esquerdo e ainda conseguiu dar algum ar da sua graça.
Danilo Pereira: Entrou para reajustar a defesa após a expulsão de André Pinto. Beneficiou do relaxamento dos cabo-verdianos, que geriam uma vantagem de 2-0. Apesar de tudo, cumpriu quando foi chamado.
Pizzi: Demasiado discreto para aquilo que se lhe exige. Terá de mostrar mais se quiser espreitar um lugar na primeira equipa.
Éder: Ainda não foi desta vez que se estreou a marcar. Entra sempre com vontade, mas não consegue assumir-se como alternativa credível para um lugar onde há tanta escassez de opções.
André André: Foi uma espécie de bálsamo numa equipa deprimida. Provou ser merecedor de outras chamadas.
André Almeida: Entrou para colocar ordem no sector mais recuado, valendo-se da sua experiência e tarimba internacional.
E agora?
Esta tentativa gorada de avançar com o processo de renovação foi mal planeada, nem parece de um engenheiro. Então, quais serão os passos certos a dar?
- Começar por identificar as prioridades, isto é, quais as posições tácticas onde a selecção está mais desfalcada? Quais os jogadores em final de carreira que se irão retirar em 2016? As escolhas de novos elementos devem focar-se nestes dois itens.
- Fazer a integração progressiva de jogadores. Mesmo em jogos particulares, não desmantelar a estrutura base. Efectuar alterações pontuais, lançando um a dois novos jogadores em cada sector. Os novos elementos rapidamente assimilarão as rotinas e entrosamento com os demais titulares habituais.
- Tal como referiu o Daniel Lourenço, a selecção nacional tem todas as condições para garantir o apuramento mais cedo, sem ter de esperar pelo último jogo como vem sendo habitual. Portanto, os últimos jogos do apuramento poderão servir de laboratório de ensaio de novas opções.
- Na sua apresentação, Fernando Santos assumiu que contava com todos os jogadores. Está correcto. Porém, é necessário identificar determinados jogadores, cujo contributo está esgotado e não trarão mais nenhum valor acrescentado, como é o caso de Hugo Almeida, mas há outros jogadores na mesma situação.
- Finalmente, estar muito atento ao Campeonato da Europa de Sub-21 a disputar na República Checa no final da época. As jovens esperanças lusas vão ser colocadas à prova diante de selecções fortes. A este nível de competição é possível destrinçar aqueles que reúnem as condições para estarem no Europeu de França do próximo ano.
Ricardo Jorge
Texto redigido de acordo com as normas do antigo Acordo Ortográfico (Decreto lei 35.228/45)